sexta-feira, março 04, 2011

O velho e o diabo


Chamou o diabo. Puxou a faca pensou na melhor forma de fazer aquilo ser menos doloroso.

O diabo demorava. A coragem dava lugar a perguntas e receios. Lembranças do que poderia ser vivido. Nunca lembranças de alguém, não achava que tinha alguém. Nunca teria alguém.

Que demora. O diabo tarda e às vezes até falha. Que demora
Ô, infeliz!

acendeu um cigarro, ainda tinha tantos cigarros no maço, que pensou em fumar mais alguns antes de morrer.

Um suicida num lugar daquele. Nunca se via um suicida num lugar assim. Só se fosse um enforcado, mas alguém pensando em tristezas além de fome, sede, seca, falta de água e alimentação, falta de educação… não, ali isso era lenda. Coisa de cidade grande.

Mas era difícil de definir mesmo o que estava lá dentro, amassado, travado, como se fosse um caroço, sei lá o que.

O diabo é mesmo um cara muito desligado, ou eu não sirvo nem sequer pro diabo?
Ai, a vida dói. Não só pela seca, não só pela fome, não só pela poeira, não só por ser pobre, não só por estar só, entregue à solidão, solidão simples, não por querer. Ela se foi. Pra isso o diabo serviu, levou ela de mim. Mas não foi doença. Foi mesmo traição. Outra pessoa.

E o diabo demora. Não respeita nem sequer um moribundo. Ah, filho da…
Se eu fosse deus eu matava o miserável.
Mas se eu fosse deus muita coisa seria outra coisa.
Ou seria pior?
Hum…

Acho que vou fumar mais um cigarro enquanto o capeta não chega.

Ah… Porra! Já fumei, perdi parte da coragem e nada do diabo…

Noite adentro, sem menos esperar, já cochilando, com um único cigarro a ser devorado em tragos, foi que ele apareceu, com um matinho na boca, olhando aquele senhor, triste criatura. Nem eu deveria querer esse desgraçado. Mas se assim é, que seja.

Acordou o homem, que enfiou a faca no ventre do diabo.

Opa, quem és?

Tanto chamou. aqui estou

É, está mesmo. Nada lhe fez a faca.

Ah, sim. Mas o que queres? Vai mesmo dar cabo da tua vida?

Pois é, satan. Viver é sofrimento para valentes. Eu sou por demais covarde.

Mas e deus? Nele não crês?

Ah, deus… se estás aqui é porque ele existe, mas ainda há muitas perguntas a fazer. Por exemplo, por que você demorou e apareceu e deus nunca aparece?

Ah, meu erro foi fazer respostas e não respondê-las. Os erros dos homens vêm da teimosia em fazer dúvidas, fabricar perguntas. Para quê? Por que não vives somente?

Ah, não me chateia diabo, queres ser santo agora?

Tosse.. Tosse… Acendeu mais um cigarro e prestou atenção no diabo que olhava em volta, como se incomodado.

Mas que diabo é esse? Ele se veste como se tivesse no lugar errado. Dizem queo diabo se pinta como é pensado, mas eu nunca pensei no diabo assim. Pensem no diabo que vocês pintam e como seria um diabo estranho. É algo difícil de pensar?

Só tenho mais esse cigarro pra decidir pela vida e pela morte. O que diz tu, diabo?

Eu? Ah, nada não. O diabo não tem muito pra falar. Vocês homens que falam demais.

Pois é. Fuma?

Ah, não. Tô tentando parar.

Ah, diabo, vai pro inferno que lá não quero ir pra ter que ir ficar vida morta num lugar onde até o diabo virou covarde!

Calma, homem. Mas diz aí a finalidade da tua morte?

Sei lá, diabo. O mundo não é suficiente. A vida não é suficiente. O sol queima demais. O homem mente demais. A vida não me é amena. Eu desisto de tentar qualquer coisa e até mesmo a morte parece me escapar nesse momento onde eu só quero…

Engasgou, emudeceu… E pôs-se a chorar. Assim de repente.

O diabo vendo aquilo olhou a criatura e disse. Olha só, vou te deixar só, porque você precisa pensar muito e nada melhor pra chamar a morte que a solidão. Enfim, nada tenho eu pra ganhar contigo se não queres nada além de perecer e vaguear.

Vou-me!

E assim foi o diabo entre a fumaça.

Não deixou nem um cigarro e nem sequer houve finalidade em sua visita.

A verdade, moços, é que não se deve pensar em finalidades. O que dizer de nada? O que explanar sobre tudo?

A verdade é um velho que chama o diabo e o perde em meio a tanta conversa.

Não espero nada, nem do verso nem da escrita. Na prosa eu me perco em pensamento, pois o diabo me dá o sono e a poeira no olhos para que não haja nada a ver, nada a dizer, além de cigarros e tosse.


Josi Vice

Novo poeta do século XXI

Um comentário:

Anônimo disse...

adorei a foto
vou ateh por no blog lah
kkkkkkkk
adorei
vlw por postar aki